terça-feira, 9 de novembro de 2010

ninhos

Naquele tempo os rapazes andávamos aos ninhos. Nas árvores ou nos barrancos porque os dos beirais era pecado destruir, a andorinha era sagrada. Ripar freixos e olmos era meia certeza de ninho achado, em geral nas trepolas. Cultivava-se o achamento: apostava-se quantos cada um sabia, visitavam-se pouco para não espantar a mãe e provocar o abandono (quantas não enjeitei por causa da curiosidade em vê-las a dar o subiaco aos implumes!), guardava-se segredo do sítio e, sobretudo, não se revelava à luz da candeia para não ir lá a cobra. Variadas eram as formas dos ninhos; em originalidade ganhava o pica-pau, mas alguém se atrevia a meter lá a mão? Depois havia os que apanhavam os pássaros.Também fiz algumas maldades que não confesso, mas logo me arrependia. O que entusiasmava era achar ninhos de carriça («a carriça diz a missa com sapatos de cortiça»). Já ninhos de pardal («o pardal muda o missal com sapatos de cabedal») não estimulavam.
E agora esta pequena pérola do nosso Miguel Torga para a pituxa a quem o Pai já mostrou ninhos na Vila Dala:

«Segredo»

Sei um ninho.
E o ninho tem um ovo.
E o ovo, redondinho,
Tem lá dentro um passarinho
Novo.
Mas escusam de me atentar:
Nem o tiro, nem o ensino.
Quero ser um bom menino
E guardar
Este segredo comigo.
E ter depois um amigo
Que faça o pino
A voar...

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